Arte pela reconfiguração social Amor-Tecimento (2019), de Renata Felinto (Foto: Cortesia da artista)

Arte pela reconfiguração social

A artista Renata Felinto, vencedora do Prêmio seLecT na categoria Arapuru, discute questões raciais sob múltiplas perspectivas

Leandro Muniz

Em uma série de autorretratos de Renata Aparecida Felinto, a pintura tem um tratamento próximo ao grafitti. Alguns de seus desenhos têm traços delicados, mas retratam a hipersexualização de corpos femininos. Em uma performance de tom crítico, a artista cria um white face (tipo de performance em que uma pessoa negra usa maquiagem teatral para parecer uma pessoa branca)para ironizar os comportamentos afetados de uma elite branca, enquanto em outra, a situação de afeto e contato entre pessoas pretas, busca criar um contexto de autocuidado e cura. A diversidade de recursos formais, de linguagens e posturas – do conforto à acidez – utilizados na produção de Felinto demonstram que o debate racial e suas intersecções no campo artístico estão na ordem do inquieto e do insubordinado, como reflexo de diversas tensões sociais.

História
Nascida em 1978, na Zona Norte de São Paulo e criada na Zona Leste da cidade, Renata Felinto é doutora em artes visuais, testemunha e agente das transformações dos debates sobre raça, gênero e classe no sistema da arte ao longo dos últimos 20 anos. “Estudei na Unesp no final dos anos 1990 e uma das poucas pessoas negras que estudavam arte lá, na época, era a Janaína Barros. Outras pessoas negras não continuaram porque o sistema impede que elas possam acessar esse lugar”, diz Felinto à seLecT.

Estimulada pela família a buscar no estudo uma forma de transformação social, Felinto participou desde a adolescência em diversos cursos de desenho, realizando inclusive um curso técnico na área na ETEC Carlos de Campos, na região do Brás, o que ampliou sua circulação e compreensão da cidade. Na época, a artista fazia fanzines sobre o neonazismo, que era muito forte na São Paulo dos anos 1990.

“As questões raciais não eram uma discussão na minha família como é hoje, porque estava dado que somos pessoas pretas, que ouvem samba, vão em baile black, só se relacionam com pessoas pretas, e até discutem as experiências de racismo que sofrem, mas não do mesmo modo politizado como é hoje, era orgânico”, diz.

Quilombos urbanos
As configurações da cidade também fazem parte de sua formação e produção. “Com o tempo entendi a zona norte como um quilombo tradicional de São Paulo, principalmente para pessoas pretas com fenótipos marcados. Minha família não é parte de nenhuma escola de samba, mas acho que é uma forma negra de viver a vida que faz parte da minha história” continua. “A Zona Leste também é um quilombo, que tem no pagode e no hip-hop formas de expressão. Isso é importante, porque existem as periferias precárias, mas existem várias que são espaços de criação, e estou me referindo inclusive ao Brasil como uma periferia do mundo.”

Em meio às adversidades da cidade e do próprio sistema de arte, as relações entre arte e educação foram não só uma alternativa para a sobrevivência – trabalhando em educativos e depois trilhando uma carreira acadêmica –, mas também sedimentou a compreensão de que o trabalho de arte tem uma dimensão formadora. “Para mim é fundamental pensar arte como educação, como um lugar de criação de novos mundos e reconfiguração social”, afirma. “A carreira acadêmica passou a me interessar também pela possibilidade de liberdade artística, sem precisar me submeter a determinadas situações que são muito violentas para quem quer sobreviver de arte. É uma disputa muito desleal.”

Performar a vida
Desde 2016, Felinto é professora na Universidade do Ceará, no campus do Cariri, adicionando uma nova camada de questões sociais para sua prática e pesquisa: os conflitos culturais. A diferença entre São Paulo e Ceará se manifestam no clima, na incidência da luz, nas formas de vestir, comer e consequentemente na Cultura e na produção artística do local, levando a rever os cânones da história da arte, seus limites e potências em relação àquele contexto. “Fiz uma performance sobre isso, que era basicamente ir abandonando minhas roupas de inverno pela cidade, como uma troca de pele.”

A ideia de “performar a vida” é cunhada pela própria artista em textos e oficinas, como uma ampliação de uma das maiores lições do feminismo negro para a construção do conhecimento em geral: reconhecer as experiências do sujeito em sua compreensão do mundo, conectando biografia, contexto e epistemologias. A cada trabalho, seja em desenho, fotografia ou performance mesmo, Renata Felinto replica ou desconstrói alguma das pequenas violências e contradições implícitas na própria ideia de raça, por vezes com o objetivo de denúncia, por vezes, de cura.

“Ultimamente tem me interessado pensamentos de matrizes africanas fundadas no afeto e no auto-cuidado como forma de combate ao racismo estrutural, considerando desde o que você tem acesso como alimentação, moradia, rede de acolhimento e, claro, cultura.”

Renata Felinto foi contemplada no 3º Prêmio seLecT de Arte e Educação na categoria Arapuru com o trabalho AMOR-Tecimento, oficina com performance que tem por objetivo resgatar o olhar amoroso e empático sobre os corpos de pessoas negras. Foram encontros formativos com culminância em performances, propondo a descolonização da noção pedagógica da arte. “Nosso público alvo inicial são as pessoas negras que passaram e passam por situações traumatizantes de racismo decorrente do processo inserção de sociedades não europeias nas economias do capitalismo”.

O Prêmio Arapuru é uma nova categoria de premiação, criada graças ao apoio da Arapuru Gin e a consciência da marca na necessidade de se viabilizar a arte e a educação no Brasil hoje. Para o desenvolvimento futuro do projeto de Renata Aparecida Felinto, a marca destinará o valor de R$6.000,00, distribuídos periodicamente. Segundo a artista, o prêmio viabilizará uma nova etapa de AMOR-Tecimento.

Educar é mais importante do que colecionar O artista Luis Camnitzer em retrato de 2012 (Foto: Divulgação)

Educar é mais importante do que colecionar

Palestrante do 3º Seminário seLecT de Arte e Educação, Luis Camnitzer fala sobre a urgência de repensar a função dos museus

Nathalia Lavigne

Usar a arte para estabelecer conexões a partir de um fazer coletivo esteve desde sempre entre as principais abordagens do artista, crítico e pedagogo Luis Camnitzer. Sua frase-instalação “O Museu é uma Escola: o artista aprende a se comunicar, o público aprende a estabelecer conexões” resume alguns dos aspectos fundamentais em sua trajetória de mais de cinco décadas. Idealizada em 2009 e exibida desde 2011 em fachadas de mais de 20 instituições, entre elas o Museu de Arte Moderna de São Paulo, em 2016, a instalação é um dos trabalhos mais conhecidos do artista nascido na Alemanha (1937), criado no Uruguai e radicado em Nova York desde 1964. Foi lá que iniciou sua produção como integrante do coletivo The New York Graphic Workshop (1964-1970), e junto com outros latino-americanos imigrantes como Liliana Porter e Luis Felipe Noé explorou técnicas democráticas de impressão e a combinação entre imagem e palavra.

Desde então, Camnitzer construiu uma obra múltipla e em diversas frentes, mas que muitas vezes levam a uma mesma conclusão: “O que falo é quase sempre igual: que a arte e a educação, quando bem compreendidas, são mais ou menos a mesma coisa”, afirma à seLecT. Nesta entrevista, ele comenta sobre o desmantelamento das estruturas comunitárias, reforçada pelo atual contexto, e do papel da arte como um instrumento utópico de sobrevivência.
O artista é o palestrante inaugural do Seminário seLecT de Arte e Educação, que será transmitido ao vivo na plataforma da seLecT no Youtube: youtube.com/c/selectartbr. Na palestra The New Man, na terça feira 15, às 16h, ele fará uma recontextualização para os dias de hoje das ideias de Che Guevara sobre arte e sociedade.
O seminário é a terceira etapa do Prêmio seLecT de Arte e Educacão, uma iniciativa organizada pela revista seLecT desde 2017, criada para valorizar e incentivar escolas, instituições de arte, espaços de ensino, projetos artísticos colaborativos e iniciativas inovadoras e experimentais que favoreçam os diálogos e os vínculos entre arte e educação. A terceira edição tem co-realização do Itaú Cultural, apoio da galeria Almeida e Dale, parceria da galeria A Gentil Carioca e da Arapuru London Dry Gin.

seLecT: Começo com uma pergunta genérica, mas inevitável nesse contexto: como tem passado nesses últimos meses e que impacto acredita que essa pandemia terá tanto na produção da arte atual quanto em novas formas de percepção artística?
Luis Camnitzer: Entre os trabalhos artísticos que tenho visto, noto muito uma produção realizada coletivamente como um quebra-cabeças, especialmente na música e na dança, criadas com vários participantes em fragmentos individuais, desde suas casas, e depois editadas para formar um todo coerente. É algo muito engenhoso, um pouco como os contos e poemas ao estilo dos “cadáveres esquisitos” surrealistas. Mas, a longo prazo, esse é também um formalismo um pouco cansativo. De forma geral, acho que há uma tendência, inclusive um perigo, de dar primazia à introspecção. Existe a possibilidade de perdermos de vista nosso compromisso social com uma comunidade com a qual só devemos ter um contato mediado. Estou, por exemplo, fazendo muitas coisas por Zoom e noto que é como falar para o vazio. Não há como perceber a linguagem corporal do público, nem mesmo uma risada quando alguém faz uma piada. Tudo isso dá a impressão que o universo se limita às quatro paredes da casa e que as angústias pessoais são mais importantes que o bem comum. Dentro de alguns anos, saberemos se isso terá um efeito duradouro ou não e quais os efeitos na arte.

Versão de O Museu É uma Escola no Matadero, Madri, em exposição de 2015 (Foto: Divulgação)


Em seu ensaio O Museu É uma Escola, o senhor afirma que a função de uma obra de arte é nos apresentar não apenas algo que não conhecemos, mas também o que não é conhecível. Acha que esse papel é ainda mais importante hoje, quando o mundo, como o conhecíamos, desapareceu?
A arte é útil para especular e explorar tudo sem limites. A sociedade e seus sistemas de ensino nos fazem acreditar que o que importa é saber memorizar o que já se sabe e, depois, ver o que se pode deduzir desse conhecimento. Com a arte, por outro lado, podemos saltar no vazio e viajar por aquele campo que geralmente é descartado como algo negativo e que chamamos de “ignorância”. No entanto, esse campo, bem compreendido, é justamente onde existem coisas que ainda não têm nome e, portanto, são livres. É o que chamamos de “mistério”, uma palavra arruinada pela religião porque tenta manter o mistério encerrado em seus dogmas. Na arte, mistério é algo que nada tem a ver com obscurantismo; é o estímulo que nos faz imaginar continuamente para desvelá-lo. É por isso que a arte é uma metadisciplina do conhecimento e não apenas uma forma de produzir objetos.

Muito se comentou, no início da pandemia, o fato do MoMA-NY e outros grandes museus terem demitido suas equipes do setor educativo, ao invés de treiná-los para migrar as atividades para o on-line. Qual a sua opinião sobre esses episódios? Como adaptaria algumas de suas ideias sobre o papel pedagógico dos museus para o mundo digital?
Este é o momento de reconceitualizar a função dos museus e assumir a responsabilidade de que educar é mais importante do que colecionar. O que a maioria dos museus está tentando fazer é preservar o passado em um formato reduzido e com o mínimo de perdas possível, ao invés de enfrentar o desafio de uma situação sem precedentes em nossa memória, que nos oferece a oportunidade de olhar para essa nova realidade como um marco zero. O que o MoMA fez é reacionário, estúpido e cego, se tentarmos olhar para o futuro. É o momento de reeducar a equipe curatorial para assumir responsabilidades pedagógicas e ampliar sua equipe pedagógica, e não de apagá-la. É hora de redesenhar a comunicação com o público e deixar de ser a única organização centrípeta tradicional para ser igualmente centrífuga, com diálogos criativos de mão dupla. A missão de um museu não deve ser fazer com que o público conheça as obras que tem ou expõe, mas sim ajudar o público a ser um agente criativo, que ajude na construção de uma sociedade melhor.

Entre as iniciativas feitas por museus, nesse período, estão as campanhas colaborativas em redes sociais, como pedidos para que as pessoas reencenassem em suas casas versões de obras de arte conhecidas. Muitas estão reunidas na hashtag #betweenartandquarentine, criada pelo Rijkmuseum, da Holanda, e copiada por outras instituições. Como vê essas iniciativas? Acredita que são válidas como formas de interlocução e tentativa de tornar a arte democrática e coletiva?
A recriação performática de obras de arte produz resultados divertidos, mas conceitualmente isso nada mais é do que um refinamento do consumo de obras de arte, semelhante ao ato de copiar uma pintura famosa. É algo que provavelmente será útil para as relações públicas das instituições, mas duvido que tenha algum impacto na democratização da arte. Pode divertir como espetáculo, mas não acredito que gere novos conhecimentos.

A Bienal do Mercosul foi um dos eventos que precisou cancelar as exposições, levando suas atividades para o espaço digital. A apresentação dos trabalhos não me parece ter funcionado bem na plataforma criada, mas houve um esforço grande de se criar uma programação educativa on-line. Como vê essas transformações depois de ter realizado a curadoria pedagógica na 6ª edição desta bienal, em 2007?
Infelizmente não tive a oportunidade de acompanhar esta Bienal do Mercosul. Sou amigo de Andrea Giunta há muitas décadas e tenho total confiança em seu trabalho. Com esta edição, em particular, a situação era difícil porque a pandemia começou quando a bienal já estava planejada. Mas diria que em geral as bienais estão enfrentando problemas similares aos museus, com a tentação de resgatar os formatos do passado e transferi-los para as telas dos computadores, ao invés de buscar um novo começo a partir da crise. Quanto trabalhei na 6ª Bienal (2006-7) com Gabriel Pérez-Barreiro, tínhamos consciência que o formato tradicional das bienais era obsoleto e tratamos, ainda que timidamente, de criar uma situação relacionada com o conhecimento ao invés do consumo. Enfatizou-se a formulação e solução de problemas, a participação da escola neste processo e a educação pública por parte do público. Quando aceitei o cargo de curador pedagógico, foi com a condição de que a equipe funcionasse permanentemente e não vinculada a cada bienal. A diretoria acatou as condições, mas infelizmente não as cumpriu, e a bienal voltou a depender da boa vontade do curador-chefe em cada uma de suas edições. Algumas bienais, portanto, se preocuparam com a parte pedagógica e outras com o estrelato curatorial. Perdeu-se a continuidade pedagógica e a possibilidade de se adaptar construtivamente às circunstâncias e, assim, minimizar o impacto das crises.

Gostaria que comentasse um pouco sobre o tema da palestra The New Man, que trata da recontextualização dos comentários de Che Guevara sobre arte e sociedade.
Talvez por causa da quarentena comecei a revisar minha própria formação de uma forma introspectiva e encontrei esse texto de ‘Che,’ que foi uma carta escrita ao diretor de um jornal para o qual eu estava trabalhando na época, o semanário uruguaio Marcha. [O texto deu origem ao livro Socialist and Man in Cuba, 1965]. Isso coincidiu com minha preocupação com o isolamento individualista produzido pela quarentena. Já se passaram seis meses. Tirando poucas e cuidadosas interrupções, vivo confinado. É uma espécie de prisão domiciliar. Isso me fez revisar meu conceito de “experiência” e contrapor ao que chamo de “in-periencia”, que é uma forma de usar o interno para processar o externo em forma de militância social. Em tudo isso há convergências e divergências com o que Che mencionou sobre arte e me pareceu um tema interessante para que pessoas mais capazes do que eu elaborem melhor mais tarde. Gostaria muito de poder ler mais material sobre isso.

Em um texto para o catálogo da VI Bienal de Havana (1977), o senhor menciona algo semelhante, sobre o desmantelamento das estruturas comunitárias e a destruição da noção de nós. Como falar sobre isso no atual contexto?
Relendo esse texto, 23 anos depois, parece que a situação é muito pior. Aos poucos, está se instalando o que chamo de “palhaçocracia” nos governos – mas com pessoas medíocres até como palhaços, pois não conseguem fazer ninguém rir. São pessoas que vivem em uma cápsula narcisista e não entendem que existe um “nós”, e que quem está trabalhando em um governo é contratado para alimentá-lo e apoiá-lo. No contexto atual, isso se tornou mais agudo. Estar em situação de quarentena, rompê-la (ou pelo menos não usar máscara), agindo fisicamente sobre o “nós”, é uma forma de contaminar e destruir a comunidade. Ao respeitá-la, ficamos isolados e o “nós” se torna virtual, corre-se o risco de se tornar uma memória nostálgica. A resistência, como escrevi naquela época, está em manter a consciência utópica de sobrevivência, não aceitar a possibilidade de derrota e usar a arte como instrumento de manutenção da saúde mental.

Programação do 3º Seminário de Arte e Educação

Programação do 3º Seminário de Arte e Educação

Com palestras de Luis Camnitzer, Dora Longo Bahia, Tainá de Paula e Sepake Angiama, o evento virtual é a última etapa de seleção do 3º Prêmio seLecT, em que os onze finalistas apresentam seus trabalhos 

Cerca de 700 artistas e formadores de 26 estados brasileiros se inscreveram no 3º Prêmio seLecT de Arte e Educação entre 1º de junho e 31 de julho de 2020. Duas fases de seleção dos projetos já ocorreram, restando apenas a última delas. Trata-se do 3º Seminário seLecT de Arte e Educação, que ocorre nos dias 15, 16, 17 e 22 de setembro, virtualmente, pelas plataformas digitais da revista seLecT. No evento, serão apresentados e discutidos os onze trabalhos finalistas e ocorrerão palestras de pesquisadores convidados. Gratuito, o seminário é voltado para estudantes, artistas, pesquisadores, outros interessados e especialistas da área.

Na primeira fase de avaliação do 3º Prêmio seLecT, coube à Comissão de Seleção, formada por Luana Fortes, Moacir dos Anjos, Renata Bittencourt e presidida por Giselle Beiguelman, pré-selecionar 23 projetos – 20 das categorias Artista e Formador e 3 da categoria Camisa Educação –, dentre os inscritos. Na segunda fase, as obras pré-selecionadas pela Comissão de Seleção foram conhecidas, analisadas e discutidas pela Comissão de Premiação, também presidida por Giselle Beiguelman, integrada por Diane Lima, Heloisa Buarque de Hollanda, Paula Alzugaray e Valéria Toloi, que selecionaram o vencedor da categoria Camisa Educação e os onze projetos finalistas – cinco na categoria Artista e cinco na categoria Formador – a serem apresentados pelos proponentes na terceira fase.

Como abertura do seminário, que acontece na terça-feira 15 de setembro, às 16 horas, a palestra The New Man, com Luis Camnitzer, em que o artista, curador e professor procurará recontextualizar para os dias de hoje os comentários feitos por Che Guevara sobre as relações entre arte e sociedade. No mesmo dia, às 17 horas, acontece também a palestra Arte e Educação: Relação ou Contato – a Articulação de Zonas de Irresponsabilidade como Princípio de Formação Artística, com a artista e professora Dora Longo Bahia. Ambas mediadas pelo pesquisador Cayo Honorato, as palestras serão transmitidas ao vivo pelos canais do YouTube e do Facebook da revista seLecT, com tradução simultânea e interpretação em libras. 

Nos dias 16 e 17 de setembro, quarta e quinta-feira, das 16 às 18 horas, os onze proponentes finalistas apresentarão seus projetos, de maneira mais detalhada, aos membros da Comissão de Premiação e ao público. Essas apresentações ocorrerão via sala de videoconferência no Zoom e poderão ser assistidas de forma simultânea e gratuita mediante inscrição prévia (Para se inscrever, clique aqui para as apresentações dos artistas e aqui para as apresentações dos formadores!). As gravações dessas apresentações também serão disponibilizadas nas redes da revista seLecT e do Prêmio seLecT na sexta-feira 18/9.


Na terça-feira da semana seguinte, 22 de setembro, às 16 horas, acontecem as palestras de encerramento do Seminário, com a curadora e educadora Sepake Angiama e com a arquiteta e urbanista, ativista das lutas urbanas e mobilizadora popular Tainá de Paula, também mediadas por Cayo Honorato e transmitidas ao vivo pelos canais da revista seLecT no YouTube e no Facebook, com tradução simultânea e interpretação em libras. Logo depois, às 18 horas, acontece, enfim, o anúncio dos premiados do 3º Prêmio seLecT de Arte e Educação, nas categorias Artista e Formador, que receberão R$ 20.000,00 cada um, a dupla premiada já divulgada Andréa Hygino e Luiza Coimbra da categoria Camisa Educação, que terá seu projeto executado e lançado pela Galeria A Gentil Carioca e os premiados da mais nova categoria Arapuru.  

O Prêmio seLecT tem a satisfação de anunciar a grande novidade desta edição, uma nova categoria de premiação em dinheiro, graças ao apoio do Arapuru London Dry Gin. Para o desenvolvimento futuro dos projetos finalistas do Prêmio seLecT, a marca de bebidas destinará o valor de R$6.000,00 para um artista finalista e de R$6.000,00 para um formador finalista, que serão distribuídos periodicamente, a partir de um percentual extraído da venda de garrafas. Os dois premiados nesta categoria também serão escolhidos pelo Júri de Premiação.

 

Conheça os palestrantes

Luis Camnitzer é artista, curador e professor. Nascido na Alemanha em 1937, emigrou para o Uruguai com apenas 1 ano de idade. É graduado em escultura pela Escola Nacional de Belas Artes da Universidade da República do Uruguai. Já recebeu prêmios importantes, como o Prêmio Frank Jewitt Mather (2011), da College Art Association dos Estados Unidos, o Prêmio Grabador Emérito (2011), da Southern Graphic Conference International, e o Prêmio USA Ford Fellow (2012). Suas obras integram coleções como as do MoMA-NY, a do Museu Reina Sofía, em Madri, e a da Tate Gallery, em Londres. Participou de exposições como a Bienal de Veneza, a Bienal de São Paulo e do Museu Reina Sofía. Além disso, foi curador de artistas emergentes no The Drawing Center, em Nova York, de 1999 a 2006, curador pedagógico da 6ª Bienal do Mercosul, curador pedagógico da Fundação Iberê Camargo, de 2007 a 2010, e assessor pedagógico da Coleção Patricia Phelps de Cisneros. Atualmente, vive e trabalha em Nova York, onde atua como professor emérito da Universidade do Estado de Nova York.

Dora Longo Bahia é artista e doutora em Poéticas Visuais pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), com pós-doutorado em Filosofia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH-USP). Atualmente, é professora no Curso de Artes Visuais da ECA-USP e coordenadora do grupo de pesquisa Depois do Fim da Arte. Suas obras se desdobram em vários suportes, como pintura, fotografia, instalações sonoras, filmes e livros. A partir do fim dos anos 1980, quando se graduou em Educação Artística pela Faap, participou de exposições e festivais nacionais e internacionais e recebeu diversos prêmios. Entre eles, o 7º Prêmio Marcantonio Vilaça, em 2019, e a Bolsa Zum/IMS, em 2016. Participou, em 2019, da Bienal Sur, em Buenos Aires, em 2018, da 9ª Bienal de Busan-Divided We Stand, na Coreia do Sul, e do 35º Panorama da Arte Brasileira, em 2017. 

Sepake Angiama é diretora artística do Institute for International Visual Art em Londres. Atua como curadora e educadora, cuja práxis se encontra no âmbito discursivo e social, a fim de reescrever coletivamente o entendimento sobre o mundo. Isso a inspirou a trabalhar com artistas que perturbam e provocam aspectos da esfera social por meio de ações e outras formas radicais de pedagogia e arquitetura. Quando coordenadora de Educação da Documenta 14, deu início ao projeto Under the Mango Tree – uma reunião auto-organizada de práticas de desaprender. A segunda edição (Visva Bharati, Santineketan) reuniu espaços geridos por artistas, livrarias e escolas interessadas no desenvolvimento de discursos em torno da descolonização de práticas educativas que desestabilizam o cânone europeu, por meio da análise de epistemologias alternativas, noções de desaprender e conhecimentos indígenas. A próxima edição do projeto Under the Mango Tree ocorrerá em Porto Rico, em 2022, com foco em epistemologias indígenas, aprendizagem land based e artesanato. Angiama foi também coordenadora de Educação da Manifesta 10, no Hermitage Museum, em São Petersburgo. Sua pesquisa Her Imaginary endereça como a ficção científica, o feminismo e formas sociais de arquitetura podem aproveitar as ferramentas perfeitas para capturar uma pedagogia da imaginação social e política.

 

Tainá de Paula é arquiteta e urbanista, ativista das lutas urbanas. Atuou em diversos projetos de urbanização e habitação popular, realizando assistência técnica para movimentos de luta pela moradia como União de Moradia Popular (UMP) e Movimento dos Trabalhadores sem Teto (MTST). Hoje presta assistência para o movimento Bairro a Bairro, onde atua como arquiteta e como mobilizadora comunitária em áreas periféricas.

Cayo Honorato é professor no Departamento de Artes Visuais da Universidade de Brasília, doutor em Educação pela Universidade de São Paulo, mestre em Educação e bacharel em Artes Visuais pela Universidade Federal de Goiás. Integra a rede Another Roadmap for Arts Education desde 2015. É pesquisador associado do Centre for the Study of the Networked Image da London South Bank University, no Reino Unido, desde 2018.

 

Conheça a dupla premiada da categoria Camisa Educação

Andréa Hygino e Luiza Coimbra (Rio de Janeiro, RJ) propuseram para a categoria especial Camisa Educação o projeto Saída de Emergência, que relaciona a educação à imagem de uma escada ascendente.

 

Conheça os finalistas

ARTISTAS

Anápuáka Muniz Tupinambá Hã hã hãe (Rio de Janeiro, RJ) inscreveu o “YBY Festival de Música Indígena Contemporânea”, um projeto que promoveu mais de 30 apresentações musicais indígenas, realizado em novembro de 2019 por um grupo de comunicadores, produtores, músicos e ativistas da causa indígena, que reuniu mais de 3 mil pessoas de mais de 50 etnias.

Anne Magalhães (São Paulo, SP) inscreveu o “Arte na Janela”, um projeto que pretende forçar os limites e encontrar os alinhamentos possíveis entre as artes do corpo e a língua dos sinais, por meio do registro e publicação de interpretação de músicas e poesias. 

Antonio Tarsis de Jesus Miranda (Salvador, BA) inscreveu “Genocídio Simbólico”, uma série de objetos e bordados que tratam sobre o apagamento do aspecto bélico e da simbologia de extermínio presente em brasões militares em oposição à imagem da segurança pública.

Gustavo Caboco (Curitiba, PR) inscreveu “Baaraz Kawau – Campo após o fogo”, uma publicação de fundo autobiográfico feita em resposta à atualização da memória dos povos Wapichana como uma proposta de diálogo com as atualidades indígenas. 

Renata Aparecida Felinto dos Santos (Crato, CE) inscreveu “AMOR-Tecimento”, um trabalho de oficina com culminância em uma performance que busca resgatar o olhar amoroso e empático sobre os corpos de pessoas negras.  

 

FORMADORES

André Vitor Brandão da Silva (Petrolina, PE) inscreveu “Mostra Flutuante de Artes Visuais”, um espaço de formação de artistas e de públicos no Vale do São Francisco organizado em torno de uma exposição feita em um barco que transita entre as margens de Petrolina e Juazeiro.

Eduarda Gama Canto (Cachoeira, BA) inscreveu “De Hoje a Oito”, um programa literário de rádio e podcast construído envolvendo escritoras/es do Recôncavo da Bahia e promovendo o engajamento com fazedoras/es culturais da região.

Galeria REOCUPA (São Paulo, SP) inscreveu “O que não é floresta é prisão política”, exposição coletiva realizada na Ocupação 9 de Julho, feita através de trocas e convívios entre uma rede de artistas, integrantes do Movimento Sem Teto do Centro e moradores da Ocupação.

Lara Ovídio de Medeiros Rodrigues (Baixada Fluminense, RJ) inscreveu “Revista VAN”, uma publicação semestral que surgiu da necessidade de produzir imagens de moda que dialoguem com a Baixada Fluminense e compila imagens realizadas pelos estudantes do Curso Técnico de Produção de Moda na disciplina Editoriais de Moda. 

Tarcisio Almeida (Salvador, BA) inscreveu “Práticas Desobedientes”, um programa de formação para jovens artistas com foco em aprendizagem coletiva e pedagogias libertárias, fruto das ações de extensão da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia.

Vicenta Perrotta Neto (São Paulo, SP) inscreveu “Arte, Cultura e Costura”, projeto de formação idealizado em parceria com o Coletivo Ateliê TRANSmoras e o Instituto Tomie Ohtake, em busca por linguagens que estimulem o desenvolvimento pessoal e o autoconhecimento de mulheres em situação de vulnerabilidade social.

 

SERVIÇO
3º Seminário seLecT Arte e Educação
15, 16, 17 e 22 de setembro, das 16h às 18h, online

  • Palestras de abertura com Luis Camnitzer e Dora Longo Bahia – 15/9 (terça-feira), das 16h às 18h, via plataformas digitais da revista seLecT
  • Apresentações de finalistas – 16/9 (quarta-feira) e 17/9 (quinta-feira), das 16h às 18h, via Zoom, com inscrições pelo Sympla (link para apresentações dos artistas | link para apresentações dos formadores)
  • Palestras de encerramento com Sepake Angiama e Tainá de Paula – 22/9 (terça-feira), das 16h às 18h, via plataformas digitais da revista seLecT
  • Anúncio de premiados – 22/9 (terça-feira), das 18h às 18h30, via plataformas digitais da revista seLecT
Desobedecer é preciso

Desobedecer é preciso

Projetos indicados ao 3º Prêmio seLecT de Arte e Educação têm forte presença de mulheres e dominância de propostas não normativas

Os 23 selecionados do 3º Prêmio seLecT de Arte e Educação dão um recado ao País: a cultura resiste e se reinventa como frente disruptiva em contraposição a todas as formas de ignorância e desmonte institucional. Refletem a força dos corpos (e mentes) não normativos, colocando em pauta a diversidade racial e de gênero e a multiplicidade de vozes que emergem da complexidade territorial brasileira. 

São projetos que reinventam as matrizes africanas, as estéticas indígenas e as linguagens das pessoas com deficiências. Pela primeira vez, nas categorias Formador e Artista, a maioria dos projetos selecionados são de proponentes não brancos, com dominância de pretos (5), pardos (4) e indígenas (2). É notável também, entre esses selecionados, a forte presença das mulheres, especialmente na Categoria Formadores. 

Destaca-se, ainda, a preponderância de trabalhos feitos colaborativamente, em formatos auto-organizados, que evidenciam, por um lado, a desarticulação institucional e a debilidade das políticas públicas de arte e de educação e, por outro, a capacidade de mobilização do setor cultural nessas áreas. Em conjunto, todos se caracterizam por uma prerrogativa de tomar a arte como lugar da política e enunciam a desobediência como princípio de uma pedagogia da diferença. 

Os projetos indicados à premiação são fruto do trabalho do Júri composto pelo crítico e curador Moacir dos Anjos, a historiadora da arte, curadora e coordenadora de educação do Instituto Moreira Salles, Renata Bittencourt e a jornalista e curadora Luana Fortes, que analisou as propostas dos 689 inscritos nesta edição nas categorias Formador, Artista e Camisa Educação. A coordenação dos trabalhos foi feita por Giselle Beiguelman, presidente do Júri de Seleção e Premiação. A direção e curadoria do Prêmio seLecT de Arte e Educação é de Paula Alzugaray.A terceira edição do evento é patrocinada e co-realizada pelo Itaú Cultural, tem apoio da Galeria Almeida e Dale e parceria da Galeria A Gentil Carioca.  

Confira aqui a lista dos 23 projetos pré-selecionados.

ARTISTAS
Ana Emília Jung
Anápuáka Muniz Tupinambá Hã hã hãe
Andrea Veruska de Souza Araujo
Anne Magalhães
Antonio Tarsis de Jesus Miranda
Daniel Rodriguez Caballero
Gustavo Caboco
Micrópolis
Rafael Pagatini
Renata Aparecida Felinto dos Santos

CAMISA EDUCAÇÃO
Andréa Hygino Rodrigues da Silva
Luiza Coimbra Paranhos Cavalcanti de Paiva
Marcelo Drummond Lage

FORMADORES
André Vitor Brandão da Silva
Eduarda Gama Canto
Érika Lemos Pereira da Silva
Galeria REOCUPA
Janaína Castoldi
Lara Ovídio de Medeiros Rodrigues
Panmela Silva e Castro
Rúbia Mércia de Oliveira Medeiros
Tarcisio Almeida
Vicenta Perrotta Neto

Apresentações, statement do júri e anúncio de vencedores Finalistas do 2º Prêmio seLecT no Seminário de Arte e Educação, realizado no CCBB-DF (Fotos: Guilherme Kardel)

Apresentações, statement do júri e anúncio de vencedores

Abertura do Seminário de Arte e Educação do 2º Prêmio seLecT, com apresentação de Paula Alzugaray, diretora da revista seLecT, na manhã do dia 11/9, no CCBB-DF.

Em abril de 2018, dedicamos uma edição da revista seLecT à discussão sobre a ausência de política cultural no Brasil. Quatro meses depois, estamos diante da destruição do Museu Nacional, que guardava a memória dos muitos povos que constituem o Brasil.

Com esse evento, o que era ausência de políticas culturais e falta de respeito pela história, a cultura e a educação no Brasil, ganha a fisionomia de crime.

Qual a diferença entre assistir aos atentados a monumentos históricos no Oriente Médio pelo Estado Islâmico, ou à destruição das Torres Gêmeas nova-iorquinas pela Al-Quaïda, e a aniquilação de 90% do patrimônio material e imaterial guardado no Museu Nacional?

O destino calamitoso do nosso patrimônio é, sim, comparável a atos de terrorismo na medida em que é resultado da incapacidade de zelo e ao desprezo de seus próprios guardiães. Faço minhas as palavras do historiador da arte Rafael Cardoso no texto “O Brasil na Fogueira”, publicado na semana passada na revistapessoa.com.

“Como coletividade, não soubemos zelar por aquele patrimônio, assim como não atribuímos o devido cuidado a nenhum de nossos preciosos acervos públicos e instituições culturais. Somos uma sociedade que não respeita o berço em que nasceu. Como certos pássaros, emporcalhamos o próprio ninho. Jogamos lixo na rua, esgoto no mar, veneno nos rios. Roubamos monumentos para fundir o bronze e vender por peso. Nomeamos para cargos públicos pessoas que surrupiam o patrimônio da nação”.

Reconhecemos que o destino do Museu Nacional não é um caso isolado. Para citar outros casos emblemáticos, há 40 anos, o acervo do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro foi convertido em pó em um incêndio de proporções similares ao da Quinta da Boa Vista.  Em 2014 foi a vez do Liceu de Artes e Ofícios, de São Paulo, em 2015 do Museu da Língua Portuguesa, e em 2016 da Cinemateca Brasileira.

Mais uma grave evidência de que recursos são invariavelmente retirados da educação e da cultura a fim de maquiar contas que não fecham, desde 2015, dezenas de cursos de ensino superior de arte e design desapareceram sob a lógica de que a oferta educacional é um produto e o público, consumidor.

Paula Alzugaray abre trabalhos do Seminário de Arte e Educação do 2º Prêmio seLecT

Em artigo publicado na edição Política Cultural da seLecT, a professora e pesquisadora Mirtes Marins de Oliveira elucida o desmonte sistemático da educação artística no Brasil, recorrendo a informações fornecidas pela Associação Nacional dos Pesquisadores em Artes Plásticas (ANPAP), que fornece os dados consolidados do Cadastro do e-MEC de Instituições e Cursos de Educação Superior para a área de artes visuais. Em 2015, o documento aponta para a descontinuidade ou fechamento total de cerca de 28% dos cursos de bacharelado e 20% das licenciaturas – presenciais e à distância – em Artes Visuais no Brasil. No mesmo documento referente ao ano de 2016, dos 367 cursos oferecidos no segmento Artes Visuais, 17 estavam em processo de descredenciamento solicitado pelas próprias instituições.

A esse quadro, soma-se a nova versão da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para o ensino médio no que diz respeito ao ensino de Artes e Humanidades, que prevê que apenas as áreas de linguagens e matemática devem ser ofertadas de forma obrigatória nos três anos do ensino médio.

O que se pode concluir de tudo isso?

Que o incêndio do Museu Nacional não é um acidente. É um desastre cultural que responde a duzentos anos de descaso e desmandos.

“O incêndio do Museu Nacional”, continua Rafael Cardoso, “além de tragédia, foi crime. Um crime que condena a sociedade brasileira quase inteira, com exceção dos poucos e bons que lutam bravamente para manter vivas a memória e a cultura contra o descaso da maioria esmagadora.”

Nesta segunda edição do Prêmio seLecT de Arte e Educação, homenageamos estes não tão poucos, mas bravos, artistas e formadores que trabalham pela formação dos brasileiros a partir da integração entre a arte e a educação.

Recebemos 250 projetos de 17 estados brasileiros.

Os seis finalistas, presentes nesta terceira e última fase de julgamento, destacam em suas propostas, segundo aponta Giselle Beiguelman, presidente do júri, novas abordagens das questões de gênero e da cultura indígena nas escolas e no cotidiano. Apontam para a urgência de pensar as relações com o meio ambiente, privilegiando um olhar para a diversidade e a experiência do compartilhamento, e propõem interlocuções mais fluidas entre o público e as instituições, alterando as formas de circulação e experimentação dos espaços.

Ressalto que os seis projetos apresentados hoje no Seminário de Arte e Educação notabilizam-se por sua capacidade de transcender os modelos de educação formal, abrindo possibilidades para acreditarmos na construção de um Brasil possível.

Centro Cultural Banco do Brasil em Brasília

 

Nesta manhã, teremos três proponentes da categoria ARTISTA, que contempla autores de obras artísticas cujo foco de pesquisa envolve estratégias de formação e mediação, visando promover o pensamento crítico e as relações entre indivíduo e seu meio social. São eles:

Bruno Moreschi (SP), com o trabalho A História da _rte, que reúne dados quantitativos e qualitativos sobre 2.443 artistas encontrados em 11 livros utilizados em cursos de graduação de artes visuais no Brasil.

Cecília Andrade (CE), com o trabalho Excursão Pajeú, exposição na qual público é convidado a procurar e refletir sobre o riacho Pajeú, rio em desaparição, na cidade de Fortaleza.

Sue Nhamandu (SP), com o trabalho Ryzoma Pornoklasta, uma pedagogia de conscientização sobre a vitalidade do sistema patriarcal, baseada em exercícios eróticos que explicitam os mitos das diferenças entre masculino e feminino.

À tarde, após o intervalo para almoço, teremos três proponentes da categoria FORMADOR, que contempla professores/ agenciadores/ formadores ou instituições responsáveis por projetos comprometidos com uma pedagogia para as artes, assim como com o empreendimento de modelos inovadores de educação da arte ou pela arte. São eles: 

Instituto Tomie Ohtake e Centre Pompidou (SP), com o trabalho Alucinações Parciais: exposição-escola com obras-primas modernas do Brasil e do Centre Pompidou, mostra coletiva que traz educação como plataforma central para criação de relações entre públicos e obras.

Maya Inbar (RJ), com o trabalho Programa de Arte Ambiental, em que a professora do Colégio de Aplicação da UFRJ propõe debates e atividades sobre natureza, agrofloresta e diversidade.

Tales Bedeschi (MG), com o trabalho Arte indígena na escola não indígena, que desenvolve abordagens metodológicas para estudar o universo epistemológico, cultural e artístico de povos indígenas na escola.

O Prêmio seLecT de Arte e Educação é uma iniciativa da revista seLecT, a fim de contribuir para a difusão de novos modelos de educação em favor da formação intelectual e cultural do cidadão.

O Prêmio conta com incentivo do Ministério da Cultura, por meio da Lei de Incentivo à Cultura (Lei Rouanet), e só é possível graças ao patrocínio do Banco do Brasil e da Galeria Almeida e Dale. Agradecemos também à parceria da Galeria A Gentil Carioca, que este ano associa ao Prêmio seLecT o seu projeto Camisa Educação; e aos nossos colaboradores, Luana Fortes, jornalista da revista seLecT, Ana Diniz e Bê Machado, da Editora Três; e nosso júri de seleção e premiação formado por Giselle Beiguelman, Marcio Harum, Cayo Honorato, Mario Ramiro e Ana Avelar. A todos, muito obrigada.

Finalistas e membros do júri de premiação do 2º Prêmio seLecT de Arte e Educação

 

Fala de Paula Alzugaray, diretora da revista seLecT, que abriu as apresentações dos finalistas na tarde de 11/9 no CCBB-DF.

Eu gostaria de abrir os trabalhos desta tarde do 2º Seminário seLecT de Arte e Educação com uma história contada por Renato Janine Ribeiro, professor titular de ética e filosofia política da Universidade de São Paulo. Esta história está contada no livro “A pátria educadora em colapso” (lançado pela editora Três Estrelas no início deste ano de 2018).

A EDUCAÇÃO PRECISA SER CRIATIVA

No filme O Diretor de harmonia (2014), de Luiz Bolognesi e Lais Bodanzky, o educador Tião Rocha conta que nos anos 1980 foi nomeado pró-reitor de uma universidade mineira e no mesmo dia teve uma reunião com um secretário de estado. Discutia-se crise, segurança, disciplina. Tião pediu a palavra e disse:

– No Brasil há uma escola que nunca teve crise, evasão, dependência, segunda época, violência, quebra-quebra.

– Essa escola não existe, professor!, disseram

– É essa escola que temos de criar. Mas ela já existe.

– Qual?

– É a escola de samba. Você já ouviu falar de crise em escola de samba, em bomba, repetência, evasão? Alguém ja tomou bomba em tamborim?

Aquilo criou um mal-estar, segundo o educador. Então uma senhora, assessora do secretário, disse:

– Professor, isso aqui é uma reunião séria!

Tião respondeu:

– A senhora não conhece nada de escola de samba. Na sua escola não há um encarregado da disciplina?

– Claro.

– Pois a escola de samba não tem um encarregado da disciplina. Escola de samba tem diretor de harmonia!

“Fechou o tempo”, contou Tião, que comentou em seguida: a educação brasileira tem muito a aprender com a cultura brasileira. Joãozinho Trinta, lembrou ele, transformou uma cidade a partir de uma escola de samba. Nilópolis é em grande parte produto da Beija-Flor, escola que o carnavalesco dirigiu durante muito tempo. E que tem diretor de harmnia.

Tião Rocha diz que foi demitido no mesmo dia de sua posse e que a escola de seus sonhos – e que deveria ser a do sonho de todos – é a que faz o aluno desejar frequentá-la também aos sábados e aos domingos.

Paula Alzugaray e Giselle Beiguelman anunciam as vencedoras do 2º Prêmio seLecT de Arte e Educação: Sue Nhamandu e Maya Inbar

Anúncio de vencedores e statement do júri de premiação, composto por Ana Avelar, Cayo Honorato, Mario Ramiro e presidido por Giselle Beiguelman

Fazer um Prêmio dedicado à arte e educação no Brasil de hoje é, em si, um ato de resistência. Não existem áreas mais abandonadas, atacadas e vilipendiadas que essas no nosso momento histórico.

Na contramão do processo de desmonte das políticas públicas de fomento ao ensino, à pesquisa, e à criação, os seis finalistas desta segunda edição do Prêmio seLecT de arte e educação são a expressão da relevância desse debate.

Atuando como artistas e como formadores, seus projetos contemplam a urgência de discutirmos pedagogias para dar conta das demandas da lei 11645, que tornou “obrigatório  o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena, no âmbito de todo o currículo escolar”, e dos apagamentos a que foram submetidas suas histórias e saberes.

Trazem novos aportes às práticas voltadas à educação ambiental, sexual e patrimonial e revelam novas dimensões das ambivalências das definições de gênero e das políticas do corpo no espaço. Revelam, ainda, a potência do ensino público, instância a que estão ligadas a maior parte dos projetos finalistas, e a determinação dos artistas de e professores.

Em suas práticas, assumem o desafio de conceber mundos onde a questão principal é “Como fazer COM e não fazer PARA ou POR?”. O que unifica a multiplicidade das propostas dos finalistas é a aposta na construção de processos coletivos, nos quais a escuta do outro, o respeito e a compreensão das diferenças são centrais.

Sue Nhamandu e Maya Inbar, as vencedoras do 2º Prêmio seLecT de Arte e Educação nas categorias Artista e Formador, respectivamente

Eles e elas propõem tecnologias sociais para desvendar as formas de produção social do espaço urbano, como faz Cecilia Andrade, de Fortaleza, com Excursão Pajeú, e para desconstruir uma historiografia hegemônica, que ocultou as mulheres e suprimiu as artistas negras da história da arte, como fez Bruno Moreschi e sua equipe multidisciplinar, no seu meticuloso a historia da _rte [um projeto que se tornou referência para as pesquisas na área, como atestaram as diversas citações feitas ao seu banco de dados por outros finalistas].

Chamam nossa atenção para necessidade de romper com os cânones estabelecidos, como Sue Nhamandu, que propõe, em experimentos performáticos, a descolonização do corpo feminino, e o Insituto Tomie Ohtake, que apresenta, a partir da exposição Alucinações Parciais, uma proposta que implode os limites entre espaço expositivo e educativo.

Enfrentando os desafios da contemporaneidade, Tales Bedeschi Faria, de Belo Horizonte, e Maya Inbar, do Rio de Janeiro, discutem, respectivamente, como elaborar uma pedagogia indígena para não-indígenas e o Programa de Arte Ambiental. Tales desenvolve uma metodologia baseada na participação e contato e com as populações indígenas. Já Maya Inbar, procura articular na prática da educação ambiental, uma visão transdisciplinar que torna indissociável a criação artística do processo de conhecimento da natureza e de nós mesmos.

Destinado a projetos integralmente realizados até a data de seleção dos finalistas pelo Júri, o Prêmio não se é voltado ao fomento de projetos a serem desenvolvidos.

Para a premiação, o Júri do 2º Prêmio seLecT de Arte e Educação destacou os projetos que atestaram potência para formular e experimentar metodologias pedagógicas inovadoras,  sintonizadas com as demandas do País e da contemporaneidade.

Na categoria artista, premiamos Sue Nhamandu, com um projeto que propôs um enfoque radical para problematizar as ambivalências das noções de gênero, a partir da educação sexual, pensando a prática pedagógica como elemento fundamental de constituição da subjetividade.

Na categoria formador, voltamos nossa atenção para a escola como um agente de transformação social a partir do projeto de Maya Inbar. Por ser o centro irradiador de uma cultura pautada pelo reconhecimento da diversidade, essa escola plural expande as noções de consciência ecológica. Abre-se para possibilidade de uma prática transdisciplinar e de novas pedagogias que privilegiam o prazer do processo de aprendizagem.

Por fim, oferecemos a Bruno Moreschi a oportunidade de desenvolver uma Camisa Educação, projeto da nova parceira do Prêmio seLecT, a galeria A Gentil Carioca. A camiseta será lançada em fevereiro de 2019, na exposição Abre Alas.

Os finalistas foram presenteados com exemplares da Camisa Educação
Enterradas vivas: estratégias neoliberais Estudantes marcham em São Paulo, aos gritos de “Não tem reforma, vai ter luta!”, contra a reforma do Ensino Médio, em 2016 (Foto: Agência Brasil)

Enterradas vivas: estratégias neoliberais

Cursos de ensino superior de arte e design desaparecem sob a lógica de que a oferta educacional é um produto e o público, consumidor

Mirtes Marins de Oliveira

Desde 2009, quando do início de descontinuidade das ações de um mestrado em Moda na cidade de São Paulo, verifica-se que, de forma sistemática, algumas Instituições de Ensino Superior (IES) optaram por encerrar a oferta de cursos no campo da arte e do design. Uso a palavra descontinuidade por tê-la escutado várias vezes em processos que acompanhei de perto. Seu uso tem uma função apaziguadora de professores e alunos, embutindo, por parte das IES, morte lenta ao processo de fechamento desses cursos, uma exigência da legislação que prevê que os alunos já matriculados devam ser atendidos até o final do curso.

Quase dez anos depois, e com o acúmulo de outros casos, é necessário levantar hipóteses sobre possíveis causas dessa situação: seria um ataque deliberado das instituições educacionais especificamente ao campo artístico, histórica e supostamente considerado criativo, crítico e inovador?

Para tentar estabelecer outros vínculos, aproveito informações concedidas pela Associação Nacional dos Pesquisadores em Artes Plásticas (Anpap), que fornece os dados consolidados do Cadastro do e-MEC de Instituições e Cursos de Educação Superior de 2015 para a área de artes visuais. Naquele ano, o documento aponta para a descontinuidade ou fechamento total de cerca de 28% dos cursos de bacharelado e 20% das licenciaturas – presenciais e a distância – em Artes Visuais (e cursos afins como Arte e Moda ou Arte com Habilitação em Figurino e Indumentária) no Brasil, incluindo nessa contabilidade iniciativas de IES particulares, públicas e comunitárias. No mesmo documento referente ao ano de 2016, dos 367 cursos oferecidos no segmento Artes Visuais, 17 estão em processo de descredenciamento solicitado pelas próprias instituições.

Mas seria essa situação circunscrita à área artística? Como confrontá-la com a profissionalização visível e a consolidação de um circuito artístico em algumas regiões do Brasil nas últimas décadas? Essa relação – entre fechamento de cursos em nível superior de Artes e o circuito – pode ser estabelecida de forma tão direta? Haveria um desmonte, que seria no campo cultural ou educacional? Ou ambos? Haveria uma conexão com o contexto internacional? Não é possível compreender essa operação sem considerar que se fala de um sistema educacional cujos alvos não seriam apenas os cursos de Arte, mas, aparentemente, as Humanidades de maneira geral.

Descontinuidades
Depois de alguns anos nos quais o foco desse sistema foi a expansão da educação superior no Brasil através de políticas de acesso e apoio às instituições por meio do oferecimento de cursos a distância, das políticas de cotas, do Programa de Financiamento Estudantil (Fies), do Programa Universidade para Todos (ProUni), do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), verifica-se a descontinuidade também desses processos. Apesar dessa entrada por meio do ensino superior, uma visada mais ampla permite observar que esse novo desenho não se restringe nesse nível, mas é possível observá-lo em outras instâncias. Assim, é possível compreender a nova versão da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para o ensino médio a partir das descontinuidades, específicas no que diz respeito ao ensino de Artes e Humanidades, já que o documento prevê que apenas as áreas de linguagens e matemática devem ser ofertadas de forma obrigatória nos três anos do ensino médio.

Falar em sistema, no caso da arte e da educação, implica uma percepção local e global. Também em 2015, The Guardian publicou um artigo de Suzanne Moore, Our art schools have become finishing schools for a wealthy few, no qual tratava dos protestos e ocupações na Central St. Martins protagonizados por alunos de artes. Moore apontava para a abrangência desses protestos – com ecos internacionais – que chamavam atenção para cortes financeiros nos cursos daquela fundação. Sua avaliação, conforme indica o título da matéria, era a de que as escolas de arte se tornariam restritas e abertas apenas para aqueles que pudessem pagar por essa educação. Segundo a autora, a base dessa premissa é a de que arte é um luxo e, portanto, não mereceria financiamento público.

Certamente, os artistas de Arts & Crafts (do século 19) e Bauhaus (no século 20), para considerar apenas uma visada europeia, reviraram-se nos túmulos com essa formulação simplista e limitada. Mas também não é essa uma formulação que circula atualmente pelas mídias diversas sobre o papel da arte nas sociedades? Faz muito sentido buscar essa redefinição do que é arte com a finalidade de (re)encaixá-la na categoria luxo, quando se trata de, com essa operação, reduzir preocupações e, principalmente, gastos. Mas, se Arts & Crafts e Bauhaus tentaram articular inovação, criatividade e pensamento crítico (o que se espera de um ensino em Arte e Humanidades) em diálogo com o capital, o que dizer das inúmeras experiências em arte e design que buscam a experimentação? Enterradas vivas, operam nas instâncias periféricas e permanecem, portanto, sem fomento para desenvolvimento e sustentação.

De qualquer forma, urge pensar, debater e duvidar das descontinuidades, mas a pauta necessária como pano de fundo é discutir a função social da arte e também da educação. Ambas consideradas e apoiadas não apenas em nível superior ou de pesquisa, mas também como fundamento desde os primeiros anos escolares. Arte e educação para artistas e para todos. Mas estaria essa questão no horizonte do circuito artístico para além do número de passantes em catracas, que, muitas vezes, considera a oferta educacional um produto e o público, consumidor, delineado pela cada vez mais frequente atuação do departamento de marketing, que agora passa a fornecer diretrizes para as atividades educacionais. Essa constatação pode ser observada de outro ângulo: significa que certa produção artística (e sua educação correspondente) mantém-se desejável, porque inserida na lógica monetária.

Assim, o que não pode ser transmutado rapidamente nessa ordem deve ser descartado e desqualificado porque não merecedor de atenção, estímulo, investimento. Estendida para o campo ampliado das Humanidades (se ficarmos a penas no âmbito da Universidade), talvez seja possível concluir que as descontinuidades não têm como alvo o exercício do pensamento crítico, mas são resultado da incapacidade do campo de, em curto espaço de tempo, se transformar em moeda. 

Processos transversais Educadores diante da instalação Fragments de Ibrahim Mahama na exposição Ex Africa (Foto: Programa CCBB Educativo)

Processos transversais

Nova abordagem do programa educativo do CCBB entremeia processos pedagógicos, curatoriais e artísticos

Luana Fortes

Este ano foi implementado novo programa educativo, concebido pelo grupo JA.CA – Centro de Arte e Tecnologia, nas unidades do Centro Cultural Banco do Brasil. O projeto tem como coordenadores Mateus Mesquisa em Belo Horizonte, Pablo Lafuente no Rio de Janeiro, Yana Tamayo em Brasília e Márcio Harum, membro do júri de seleção do Prêmio seLecT de Arte e Educação, em São Paulo.

O principal valor considerado para o desenvolvimento da nova abordagem foi a transversalidade dos processos pedagógicos, curatoriais e artísticos. “O Programa CCBB Educativo – Arte & Educação desenvolve ações que estimulam a experiência, a criação, a investigação e a reflexão”, conta Harum à seLecT. Cada atividade é pensada de acordo com as respectivas agendas dos CCBBs e enquadra-se em um dos quatro principais eixos do programa: Transbordar, Outros Saberes, Processos Compartilhados e Acessibilidade e Inclusão.

Transbordar busca o diálogo entre os educadores do CCBB e a comunidade escolar. As atividades do eixo incluem visitas mediadas a exposições e visitas patrimoniais, que percorrem o edifício sede de cada CCBB abordando sua história e arquitetura. Também parte desse eixo são duas atividades destinadas a professores e educadores. O Curso Transversalidade aborda temas transversais entre arte e educação e a Semana do Educador, que acontece após a abertura de exposição, oferece visitas mediadas aos professores e os informa sobre a agenda paralela a cada mostra. Nessas duas atividades acontece um sorteio que na visão de Harum tem contribuído para que a programação do educativo seja inclusiva e acessível para diferentes públicos. No curso ou na semana, os professores representam a instituição onde lecionam e concorrem a um trajeto gratuito até o CCBB, com visita guiada. “O agendamento de ônibus para escolas, ONGs, associações e grupos específicos tem sido uma iniciativa de êxito para a vinda de novos públicos, e com isso os perfis de visitação vêm se ampliando”, diz o coordenador.

Um diferencial do programa é sem dúvida sua plataforma online (www.ccbbeducativo.com). Desenvolvida pelo artista e programador Andrei Thomaz, a plataforma traz a programação completa do educativo, permite o agendamento de visitas e pretende ser um espaço de memória, referência e formação, a partir de um arquivo digital. Mas como o programa acaba de ser implementado, o arquivo apenas mostra espaço para a história do novo educativo começar.

Imaginária, feminista e na Amazônia Detalhe de Instituto Experimental Tropical del Amazonas (2017). A Notebook. de Mariángeles Soto-Díaz (Foto: Cortesia da Artista)

Imaginária, feminista e na Amazônia

Mariángeles Soto-Díaz idealiza escola imaginária Instituto Experimental Tropical del Amazonas, fundada por feministas com base em culturas indígenas

Luana Fortes

Diante da instalação Instituto Experimental Tropical del Amazonas (2018), questiona-se sobre a existência de uma escola de artes na Floresta Amazônica entre os anos 1935 e 1942. Ela de fato existiu? Só na cabeça de sua idealizadora, Mariángeles Soto-Díaz. A artista venezuelana exibiu um arquivo detalhado sobre a escola imaginária no Centro de Artes 18th Street, em Santa Monica, California. A exposição aconteceu de fevereiro a maio de 2018.

Com base em conhecimentos e habilidades de etnias indígenas como Ye’kuana e Yanomami, que vivem na fronteira entre o Brasil e a Venezuela, o Instituto Experimental Tropical del Amazonas foi criado por um grupo de artistas feministas. Seu foco era reimaginar modos de viver e fazer arte em consonância com a natureza, dentro dela e até em contraste com ela. Enquanto funcionou, teve visitas de Oswald de Andrade e palestras de Le Corbusier e Sonia Delaunay.

Além de colagens, desenhos, mapas e materiais tropicais como urucum, coco e papeis de fibra feitos à mão, a obra de Soto-Díaz traz um manifesto em que afirma: “Nós esperamos que o espírito desta escola dure mais do que nós (…). Reconhecemos que por definição não existem utopias corporificadas, mas apenas a intenção de viver pela promessa de nos atirar em direção aos poderes metafísicos em circulação que só conseguimos imaginar”.

Em 1942, a escola teve um fim – mesmo que imaginário – partindo da ideia de uma instituição efêmera. Já que seu abrigo era a floresta, seguiu o mesmo caminho de um galho caído que se decompõe sobre o chão molhado. Ao acabar, o Instituto Experimental Tropical del Amazonas remanesce como ruína de um futuro perdido. A ruína de algo que nunca teve corpo, mas existiu.

Vista da instalação Instituto Tropical Experimental del Amazonas (2018), de Mariángeles Soto-Díaz, exibido no Centro de Artes 18th Street (Foto: Gene Ogami, Cortesia 18th Street Arts Center)