Outra pedagogia Encontro do grupo de acompanhamento crítico de pintura, coordenado por Regina Parra e Rodolpho Parigi

Outra pedagogia

Cada vez mais, artistas trabalham em paralelo com outras áreas, como a educação

Por Luana Fortes

 

Parece que já se foram os tempos em que o trabalho do artista era restrito à sua prática. Atualmente, é bastante comum encontrarmos combinações entre áreas que antes pareciam distantes umas das outras. Como conceituou Ricardo Basbaum, é a hora do artista-etc, aquele que além de se dedicar ao ser artista, também questiona a natureza e função de seu papel como tal. Pensando nisso, uma possível, e bastante comum, ligação é o artista-professor.

A grande maioria das universidades brasileiras que oferecem cursos de artes contam com artistas-professores como docentes. Só em São Paulo, para dar uma ideia, pode-se citar muitos nomes, como Dora Longo Bahia, Ana Maria Tavares ou Marco Gianotti, na ECA-USP; Thiago Honório, Regina Parra ou Lucas Bambozzi, na FAAP; Sérgio Romagnolo ou José Spaniol, na UNESP. Pensando nisso, aquela leviana percepção de que os profissionais atuantes na academia não conseguiram espaço no mercado trata-se de um grande engano.

Inclusive, existe, nos Estados Unidos, uma associação especialmente dedicada a essa união professor-artista, a ATA – Association of Teaching Artists. Desde 1998, a organização funciona para apoiar profissionais nessas áreas e inclui também o teatro, a literatura, música, entre outras.

Com tudo isso em vista, vale dizer que as confluências entre a arte e a educação não tendem a cessar. Assim, além do artista-formador, que vamos abordando com uma série de depoimentos, iniciados pelo da artista Regina Silveira, o artista-professor vem, cada vez mais, conquistando espaço no sistema da arte.

O artista formador: Regina Silveira Regina Silveira exercita sua interação com públicos anônimos em trabalhos de intervenção urbana como a calçada em frente à Biblioteca Mário de Andrade, em São Paulo (Foto: Paulo D'Alessandro)

O artista formador: Regina Silveira

Em série de depoimentos, grandes nomes da cena brasileira contam como transmitem seu amor e apreço pela arte às novas gerações

Por Luciana Pareja Norbiato, Felipe Stoffa e Regina Silveira

 

Ensinar é um processo múltiplo. Nenhum método de ensino dá conta sozinho de fixar as bases de atuação de seus agentes. Mesmo nas ciências exatas, a maneira como o professor lida com sua disciplina influencia diretamente os resultados e o interesse dos alunos. No ensino de artes visuais, essa fluidez epistemológica é potencializada. O ato do ensino e da aprendizagem pode começar em instituições formais, como escolas e faculdades, e ultrapassar a sala de aula para acontecer em conversas, projetos e até na rua. A produção de certos artistas não seria a mesma sem o ato generoso de compartilhar conhecimento e experiência com as novas gerações. Saiba o que Regina Silveira pensa sobre a dimensão formativa da arte:

“Ensinar arte em profundidade é orientar na busca da expressão poética própria”
Ao longo do meu percurso, sempre foi da maior importância a dimensão formativa da arte – aquela que vem embutida na sua capacidade de ser e de proporcionar um conhecimento muito particular do mundo, com o potencial de transformar magicamente o que entendemos como real e nossas próprias experiências de vida. Desde os anos 1960, estive constantemente interessada nessa dimensão e muito envolvida com atividades educativas diversas, tanto na esfera da produção/fabricação da linguagem – a do ensino da arte, onde literalmente “pendurei” algumas décadas da minha vida profissional, quanto na esfera da recepção da arte – a da sua interpretação, seus efeitos e usos, por diversos públicos.

Nessa última esfera incluo não apenas minha prática recorrente de planejar programas educativos organizados especificamente para exposições realizadas no Brasil e no exterior, geralmente em parcerias muito produtivas, como também algumas formas de arte pública que venho desenvolvendo em anos recentes, especialmente as intervenções diretas no tecido urbano, fora dos espaços instituídos da arte. Por seu grau muito ampliado de interação com públicos anônimos, as intervenções urbanas podem funcionar como assaltos à percepção comum, e se mostram capazes de modificar por muito tempo a forma de ser dos lugares ocupados.

Quanto à formação do artista, para mim, ensinar arte em profundidade é orientar na busca da expressão poética própria e é estar na do outro, para encaminhá-lo nessa descoberta, muito mais que instrumentar para o manejo de materiais e técnicas particulares. A tarefa do mestre junto ao jovem artista é ajudá-lo a dar forma e concreção às suas perguntas e formulações, dentro de uma intencionalidade que ainda é vaga ou está em construção, para que encontre aquilo que quer dizer e os modos de operar para chegar lá, seja qual for o caminho escolhido. Para o mestre, o mais importante nessa relação é a troca, pois ela é a sua melhor ponte e vínculo com as próximas gerações e novos quadros de ideias.

 

Novos museus universitários Distrito artístico da Universidade de Stanford, na Califórnia (Foto: Tim Griffith/ Anderson Collection, Stanford University)

Novos museus universitários

Em 2016, seis museus de arte foram inaugurados em universidade públicas e privadas nos EUA


Por Felipe Stoffa

 

Ao longo das últimas décadas, universidades públicas e privadas dos Estados Unidos vêm investindo sistematicamente no aprimoramento de currículos voltados às artes e a cultura. As maiores instituições de ensino superior do país estão financiando novos museus e sediando coleções. Somente no ano de 2016 foram seis museus universitários inauguradas em território norte-americano. É o que aponta a matéria recente publicada pelo site The Art Newspaper.

Acompanhando essa mentalidade, tradicionais escolas de elite como Columbia, em Nova York, e Rice, no Texas, investiram milhões de dólares para se equipararem à concorrência que já possui museu próprio, como Stanford, na Califórnia; Harvard, em Massachusetts; e Yale, em Connecticut. Os motivos estão intimamente ligados ao reconhecimento de que a arte e a criatividade serão atividades vitais para as próximas gerações, por sua influência direta na agilidade do pensamento.

Artes para além da arte
Desde 2006, a Universidade de Stanford construiu três edifícios que abrigam atualmente um distrito artístico dentro de seu campus – sendo um deles projetado para receber uma coleção de arte americana do pós-guerra. Esse complexo arquitetônico é acompanhado de uma mudança curricular: todo estudante deve realizar, ao menos, uma disciplina de expressão criativa, independente do curso escolhido. “Stanford analisou que as artes e a criatividade são vitais para a próxima geração de empreendedores, pessoas com capacidade para entender diferentes perspectivas, o que significa trazer algo de novo para o mundo”, comentou Matthew Tiews, diretor Associado para o Desenvolvimento das Artes da Universidade.

Esses jovens distritos artísticos são formulados para abrigar exposições de alto padrão e estimular a pesquisa acadêmica, além de aproximar seus estudantes do universo cultural, resgatando disciplinas que antes eram vistas como conteúdos extracurriculares e periféricos de uma educação formal. No caso de Stanford, alunos de medicina dispõem de um passeio pelas esculturas de Auguste Rodin a fim de realizarem estudos minuciosos de anatomia.

Para as universidades de Rice; Columbia; Duke, na Carolina do Norte; Princeton, em New Jersey; e Virginia Commonwealth, em Richmond, o calendário de 2017 já conta com a inauguração de museus próprios, entre os meses de fevereiro e outubro.

O caso brasileiro
O Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC-USP), é um dos maiores exemplos de museus de arte comandados por universidades brasileiras. A instituição, entretanto, é um caso excepcional no País, por ter um setor curatorial formado por professores e pesquisadores integrantes do corpo docente da USP, permitindo atividades voltadas à integração entre ensino, pesquisa e extensão cultural.

Outras instituições, como o Museu Dom João VI da Universidade Federal do Rio de Janeiro; e a Pinacoteca Barão de Santo Ângelo, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, também possuem acervos de arte coordenados pelos docentes das respectivas universidades. Entretanto, esse quadro de profissionais não permite que seus professores exerçam uma atividade curatorial permanente, já que são rotativos.

Fora da esfera pública, faculdades privadas como a Fundação Armando Álvares Penteado, em São Paulo, e a UNIFOR, em Fortaleza, possuem museus que abrigam importantes coleções privadas e mantém atividades curriculares que dialogam com o universo das artes e o mundo acadêmico.